O inferno astral de Sarkozy



Os números são claros: o presidente da França, Nicolas Sarkozy, encolheu. Não se trata da estatura física, estimada em 1m65cm, que o leva, vaidoso, a cercar-se de pessoas mais baixas em eventos públicos e de se sentir desconfortável ao lado da atual mulher, Carla Bruni, com seu 1m76cm. São, sim, os índices de popularidade que chegam a 72% de rejeição


SARKOZI, REVISTO PELO BLOG.


O aumento da impopularidade se explica. Nos útimos meses, Sarkozy expulsou mais de 8 mil ciganos romenos e búlgaros – em meio a duras críticas dos colegas europeus –, foi acusado de recebimento de doações ilegais de campanha e virou alvo de rumores sobre supostos casos de infidelidade conjugal (Carla teria um affair com o músico Benjamin Biolay, e o presidente com a política, também conservadora, Chantal Jouanno). Agora, para agravar o quadro, enfrenta protestos de estudantes e trabalhadores contra a reforma da previdência, que, nos últimos dias, praticamente paralisaram a França.

O projeto, que aumenta de 60 para 62 anos a idade mínima para a aposentadoria, foi votado e aprovado no Senado na sexta-feira.

Nos meses que se seguiram à posse, em 2007, a situação era bem diferente. Ele reaproximou seu país dos Estados Unidos – as relações entre as duas nações haviam se desgastado com a oposição do antecessor de Sarkozy, Jacques Chirac, à invasão do Iraque, em 2003 –, conseguiu a libertação de enfermeiras búlgaras que estavam presas na Líbia e, bem, casou-se com a bela cantora e modelo “La Bruni”. Era a imagem de um estadista sedutor.

Imagem. É disso que se trata. Os analistas franceses veem nela a principal preocupação de Sarkozy, homem de trajes bem alinhados, fala macia, gestos calculados, comparado a Napoleão Bonaparte pela pose de líder, vaidade, ambição e baixa estatura.

Ganhador dos prêmios Açorianos em 1995 (categorias conto e autor revelação) e Portugal Telecom de Literatura em 2005, o escritor brasileiro Amilcar Bettega pisa mais fundo.

Com o olhar de um brasileiro que vive há oito anos na Capital, Paris, Bettega compara Sarkozy ao político que mais simboliza, no imaginário brasileiro, o personalismo, a ambição desmedida e o mau uso do dinheiro público, o ex-presidente Fernando Collor.

– Ele é um Collor mais inteligente, mais bem preparado, com apoio parlamentar e um verdadeiro partido por trás. Mas a sede de poder, a atração por tudo que está relacionado com o dinheiro e a ostentação, o sentimento de onipotência e, principalmente, o uso marqueteiro da imagem, são os mesmos. Desde o início, ainda em campanha, ele sempre me fez pensar no Collor, posando de super-homem, tipo “eu faço e aconteço”. Até a celebração da vitória nas eleições lembrou o Collor, na ostentação midiática, no “cruzeiro” junto com a sua equipe no iate do amigo bilionário – disse Bettega ao Diário Catarinense.

Uma tentativa de calar a imprensa

Preocupado em preservar a imagem, o governo francês tratou de controlar a divulgação de notícias sobre os atos e palavras do presidente, para atenuar as repercussões negativas. A tentativa se deu, por exemplo, no caso das investigações ordenadas pelo governo para descobrir a identidade de uma fonte cujas revelações reforçaram as suspeitas de irregularidades – o jornal Le Monde entrou na Justiça com uma ação contra o governo por quebra do sigilo de fontes e cerceamento dos direitos individuais.

Patrick Eveno, professor e pesquisador da Universidade de Paris 1 Panthéon-Sorbonne, um estudioso da imprensa francesa e autor do livro Histoire du journal Le Monde, explica:

– Isso ocorre por causa da incapacidade de Sarkozy em resolver os problemas dos franceses. Como não pode atacar os jornalistas, é preciso dissuadir os funcionários de falar com os repórteres, ameaçando-os de punição. O objetivo é pressionar as fontes – disse Eveno, fazendo coro com 72% dos franceses, que, segundo uma pesquisa do instituto TNS Sofres, não confiam no presidente para resolver os problemas da França.

Explicações que vêm da infância

O discurso favorável à liberdade de 

imprensa e a prática de pressionar fontes é 

só uma das contradições de Sarkozy. 

Advogado, 55 anos, ex-ministro (Interior e 

Finanças), ex-prefeito de Neuilly-sur-Seine, 

ele chegou à presidência pregando a 

tolerância étnica. No poder, expulsa 

ciganos. Pior: é filho de imigrante. 

Seu pai, Pál István Ern Sárközy de Nagy-Bócsa, era um húngaro de Budapeste que viveu em Marselha como um apátrida de 1948 até a década de 1970, quando “afrancesou” seu nome para Paul Sarközy de Nagy-Bocsa. Antes, porém, em 1959, Nagy-Bocsa deixou a mulher, Andrée Mallah, com quem se casara em 1950, e abandonou, também, os três filhos – entre eles, o então futuro presidente.

Até hoje Sarkozy, o presidente que expulsa imigrantes, costuma dizer, referindo-se ao pai:

– O que me fez o que sou agora foi a soma de todas as humilhações sofridas na infância.


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